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   O que significa essa palavra grande? Onde está o sentido do tato? Não se desespere: o sentido tato (ainda) existe, e você não precisa se assustar com o sistema somatossensorial. O tato, na verdade, é o um sentido dentro de um grupo de sentidos (o único considerado pela vasta maioria da população); esse grupo é chamado de sistema somatossensorial ou sensorial somático, porque informa sobre vários aspectos do corpo, e reúne qualquer sentido que não seja olfato, paladar, audição ou visão. Isso mesmo; o modelo de cinco sentidos é simplista e exclui vários sentidos importantes, como a dor e a propriocepção (como você sente seus movimentos corporais). O sistema está distribuído pelo corpo em vez de regiões especializadas, como nos outros sentidos, por isso, seu nome deriva da palavra grega soma, “corpo”.

   Há quatro grandes sentidos dentro desse sistema: tato, dor, termocepção e propriocepção, e cada um pode ser dividido em outros sentidos. Falaremos dos três primeiros; a propriocepção está intrinsecamente relacionada com a coordenação motora e contração muscular, e por isso está mais relacionada com os mecanismos de movimentação corporal.

   É relacionado a mecanorreceptores, ligados a nervos. Os mais importantes mecanorreceptores são os discos de Merkel, os corpúsculos de Meissner (mais próximos da superfície da pele e com campos receptivos menores), os corpúsculos de Pacini e as terminações de Rufini (mais profundos, e com campos receptivos maiores). São sensíveis à variação da pressão da pele (o estímulo). Nesse sentido, além da própria variação de pressão na superfície da pele, pelos corporais são importantes no sistema somatossensorial. Exemplo: os pelos muito sensíveis do “bigode” de um rato são essenciais na obtenção de informação do meio, geralmente escuro são um exemplo.

   A variação no tamanho dos campos receptivos não depende apenas dos tipos receptores, como também do local da superfície corporal. A ponta dos dedos e a face, principalmente os lábios, possuem vários campos receptivos pequenos; os braços, pernas e o tronco tem campos receptivos grandes.

   Os nervos ligados aos receptores da pele vão para a medula, e então sobem em direção ao encéfalo, sem fazer sinapse alguma. Isso mesmo: uma única célula vai de um ponto de seu pé até sua cabeça!

   Chegando no alto da medula, acontece um fenômeno interessante: a decussação. Os nervos que vêm do lado direito do corpo fazem sinapses com neurônios que estão do outro lado no início no tálamo: como consequência, as informações do seu lado esquerdo do corpo são transmitidas para o lado direito do encéfalo, e vice-versa.

   Os neurônios no tálamo se projetam para uma região específica na superfície do córtex; lá, é formado o mapa somatotópico – um mapa de seu corpo no cérbero. No entanto, o mapa não é fiel; por terem mais campos receptivos, as regiões dos lábios e dos dedos são representadas em áreas maiores do córtex, enquanto regiões com menos campos receptivos, como o torso, possuem áreas menores representadas no córtex. Isso cria o chamado “homúnculo de Penfiled”:

TATO

TESTE: Pegue um clipe desdobrado em forma de U. Afaste as pontas em 2 cm e toque na ponta do dedo de alguém. Pergunte quantos pontos está sentindo tocar sua pele. Repita o procedimento, com as pontas do clipe mais próximas dessa vez, e continue repetindo até dizer quão próximas as pontas precisam estar para a pessoa sentir como um ponto só. Depois, faça isso em um braço ou numa perna. Você deve perceber que algumas partes do corpo são mais sensíveis em distinguir dois pontos: veja na figura ao lado as distância mínima para cada parte do corpo ser capaz de diferenciar 2 pontos.

BEAR, Mark F.; CONNORS, Barry W.; PARADISO, Michael A. Neuroscience. Lippincott Williams & Wilkins, 2001.
O homúnculo de Penfield
DOR

TESTE: peça para alguém tocar um único pelo de seu braço com a ponta de um lápis, enquanto você permanece de olhos fechados. Deverá sentir uma cócega como se um “mosquito” pousasse em seu braço.

   A dor é um sentido diferente do tato: primeiro, porque possui um tipo de receptor diferente dos mecanorreceptores, os nociceptores; segundo, porque as vias de projeções desses nociceptores é bem diferente do que dos mecanorreceptores. A nocicepção (do latim nocere; “ferir”) é o processo sensorial que provê sinais que desencadeiam a experiência de dor.

   A maioria dos nociceptores é polimodal, ou seja, responde a vários tipos de estímulos, mas há alguns que são específicos para estímulos mecânicos, outros para térmicos e outros para químicos. Os nociceptores químicos são os responsáveis pela sensação de prurido (a qual, por si só, pode ser considerada um sentido próprio).

   Diferente da via de projeção do tato, a via da dor tem decussação imediata: as informações sobre um lado do corpo vão para nervos no outro lado da medula, para então subirem para o encéfalo. Os nervos da dor e do tato andam lado a lado, mas nunca se encontram.

Vias de projeção do tato (direita) e da dor (esquerda)
BEAR, Mark F.; CONNORS, Barry W.; PARADISO, Michael A. Neuroscience. Lippincott Williams & Wilkins, 2001.

   Não há um mapa somatotópico específico para a dor como há para o tato; diferentes regiões do córtex representam as áreas do corpo. Porém, tanto nas informações do tato como nas de dor, o córtex só representa a superfície da pele; órgãos internos não têm representação. Assim, quando há informação de dor nesses locais, o córtex interpretará como se houvesse dor na região da pele próxima ao órgão afetado; por isso, pessoas que sofrem infarto geralmente sentem dor no braço esquerdo e no peito inteiro, e não no coração exatamente.

TERMOCEPÇÃO

   Antes de falar como se dá o sentido de termocepção, precisamos entender que o corpo não tem um termômetro natural. O que nós sentimos não é a temperatura real, e sim a troca de calor entre o nosso corpo e o meio. Imagine-se numa sala, com temperatura de 20° C, com uma mesa de madeira e uma moeda na sua frente. Você encosta na mesa de madeira e sente que a mesma parece não estar fria; ao encostar na moeda, você sente a pele ficar fria, e deduz que a moeda está mais fria que a mês. No entanto, pela termodinâmica, todos os objetos lá estão a 20°C, e só você está com uma temperatura diferente, devido ao seu metabolismo, algo no entorno de 37°C. O que você sente, na verdade, não é a temperatura real, e sim a troca de calor: a condutividade térmica (a quantidade de calor que um material consegue puxar em um tempo) do metal é muito maior do que a da madeira, logo, a moeda “puxa” muito mais calor da sua pele do que a madeira, e por isso você tem a impressão de que a moeda é mais fria.

   Há dois receptores para temperatura – uma para o frio e outro para o calor. Vendo o gráfico ao lado, dá para entender o porquê: cada receptor responde a faixas de temperaturas diferentes, mas que se sobrepõe em um momento. Se houvesse apenas um receptor, não seria possível distinguir qual dos pontos na curva é a temperatura certa (exemplo, se houvesse só o receptor do frio, na frequência 4, não seria possível distinguir as temperaturas de 18°C ou de 32°C – um caso parecido com os cones dos olhos).

TESTE: Coloque sua mão num balde com água fria. Após alguns minutos, coloque rapidamente a mão numa bacia com água não muito quente. Você sentirá uma sensação de queimação ou de dor. O que acontece é que, ao deixar a mão no frio por tanto tempo, você estimulou tanto seus receptores para o frio que os inativou momentaneamente. Colocando a mão na água não muito quente, os receptores para quente foram estimulados – e como os de frio estavam desativados, o seu sistema nervoso interpretou que a temperatura estava acima do real, num patamar que poderia gerar lesão: você acabou de gerar uma ilusão témica. 

BEAR, Mark F.; CONNORS, Barry W.; PARADISO, Michael A. Neuroscience. Lippincott Williams & Wilkins, 2001.
CURIOSIDADES

        REORGANIZAÇÃO DO CÓRTEX SOMATOSSENSORIAL

Deve-se ter em mente que o encéfalo como um todo é plástico, e o córtex somatossensorial não é uma exceção. Se você estimular muito uma região do corpo por um tempo prolongado, a área de representação daquela região no mapa somatotópico irá aumentar e ocupar o espaço de representação de regiões menos estimuladas. Por exemplo: um tocador de violão usa mais os dedos de uma só mão para dedilhar as cordas, enquanto a outra mão só segura o instrumento e faz as pestanas. Assim, seu homúnculo de Penfield terá a mão que dedilha as cordas relativamente maior do que a outra mão. Do mesmo modo, se ocorrer a perda de um dedo, a área representada do dedo no mapa será gradualmente “engolida” pelas áreas dos dedos vizinhos. Esse, entretanto, é um processo lento, que leva de meses a anos; assim, a pessoa que perdeu o dedo talvez possa o sentir, já que, para o córtex, aquela área do corpo ainda não foi retirada: é o fenômeno chamado de “membro fantasma”.

INIBINDO A INIBIÇÃO 

Você deve ter reparado que colocar água em cima de uma ferida geralmente alivia a dor, mesmo que ela volte quando você retira a água. Isso é porque o nervo da via de dor que sobe a medula espinhal tem sua atividade inibida por um neurônio intermediário; o qual, por sua vez, é inibido por uma projeção do primeiro neurônio que recebeu a informação da dor e que também excita o nervo que sobe a medula. No entanto, o mesmo neurônio intermediário é excitado por uma projeção de um nervo do sistema tátil. Logo, o que acontece quando há informação sobre dor é que o neurônio intermediário é inibido e a informação é estimulada a ir para o córtex; quando você coloca água num local dolorido, ou então o esfrega com a mão ou faz qualquer coisa que ative seu sistema tátil, a inibição do neurônio intermediário é inibida, e a dor desaparece.

BEAR, Mark F.; CONNORS, Barry W.; PARADISO, Michael A. Neuroscience. Lippincott Williams & Wilkins, 2001.

SISTEMA SOMATOSSENSORIAL

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